Trabalho doméstico é trabalho! Trabalho sexual é trabalho!

Registros do 1º Encontro Nacional de Prostitutas, no Rio de Janeiro, e de um encontro de empregadas lideradas por Laudelina Campos em Campinas.
No 1º de maio, a MARIA IÊDA afirma: 

Trabalho doméstico é trabalho! Trabalho sexual é trabalho!

Neste 1º de maio, nós, da Organização Anarquista MARIA IÊDA – CAB, queremos ressaltar a importância do trabalho doméstico e do trabalho sexual. Ambos geralmente são executados por mulheres cisgêneras e demais dissidências de gênero. Acreditamos que ainda há um longo caminho a ser percorrido no reconhecimento destes trabalhos como dignos e essenciais à vida. As atividades que compõem esses trabalhos são vistas como inferiores e passam por precarizações intensas, de forma que a população que o executa é marginalizada e enfrenta processos infinitamente mais árduos para se organizar e exigir melhores condições.

Donas de casa, empregadas domésticas e trabalhadoras sexuais têm em comum o fato de que o seu trabalho é visto como algo que deveria ser gratuito e fornecido sem questionamentos à população masculina cisgênera. Não à toa, o debate sobre a regulamentação da prostituição é sempre acachapado sob o argumento moral de que o corpo é sagrado e não pode ser vendido, ignorando-se que toda pessoa trabalhadora sob o capitalismo está vendendo seu corpo de alguma forma – ou em outras palavras, a velha coisificação do trabalho, e portanto da própria pessoa trabalhadora, no capitalismo. Não à toa, as trabalhadoras domésticas conquistaram apenas recentemente regulamentações que amenizassem as origens escravocratas e racistas da profissão no Brasil. Não à toa, existe no senso comum a ideia de que uma dona de casa é uma pessoa que “não faz nada”.

Por conta do processo de escravidão no território brasileiro, o trabalho doméstico, que sempre foi feito por mulheres negras escravizadas, após a abolição, seguiu sendo praticado pelo mesmo grupo social de antes, com profunda resistência das classes dominantes a reconhecer essas mulheres como pessoas dignas de respeito e direitos. Em 1936, Laudelina de Campos Melo fundou a Associação Profissional dos Empregados Domésticos de Santos, primeira da categoria. Laudelina, que já era militante da Frente Negra Brasileira em 1930, foi uma liderança importante na luta das empregadas domésticas no Brasil. Mesmo com todo o seu esforço e determinação, apenas em 1972, foi garantido o direito à previdência social e à carteira assinada e apenas em 2013, através da PEC das Domésticas, a categoria conquistou direitos semelhantes às outras profissões, como a jornada de 44 horas semanais, sendo no máximo 8 diárias e o pagamento de horas extras. Mesmo com as conquistas de regulamentação, dados de 2021 do DIEESE (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Econômicos) mostram que das 5,2 milhões de trabalhadoras domésticas no Brasil, 76% ou 4 milhões não têm sua carteira assinada, portanto não tem acesso aos direitos trabalhistas.

Já as trabalhadoras do sexo no Brasil, enfrentam níveis de precarização ainda maiores. Apenas na década de 80 que a categoria começou a se organizar enquanto tal, impulsionadas pela constante violência policial e a repressão moral da ditadura. Em 1987, Gabriela Leite e Lourdes Barreto organizaram o 1º Encontro Nacional de Prostitutas, no estado do Rio de Janeiro, para discutir o reconhecimento público da profissão e estratégias de luta. Hoje, se reconhece que o trabalho sexual abarca uma ampla gama de atividades, não apenas a da prostituição presencial comum. Políticos conservadores de direita e setores da “esquerda” organizada insistem em ignorar a urgência da regulamentação, amplamente defendida pelas trabalhoras sexuais organizadas. Embora a prostituição não seja ilegal no Brasil, todo o universo atrelado a ela é criminalizado. A perseguição e a violência que fizeram e fazem parte da rotina destas profissionais, junto com a falta de apoio da esquerda organizada no Brasil deveria ser suficiente para reconhecer nelas, sujeitas de sabedoria e conhecimentos estratégicos altamente sofisticados no que diz respeito à luta e à resistência à exploração.

Enquanto mulheres cisgêneras são empurradas e doutrinadas a executar o trabalho doméstico sem remuneração, travestis e mulheres trans são empurradas para a prostituição, sem possibilidade de exigir melhores condições de trabalho. Tanto o trabalho sexual quanto o trabalho doméstico devem ser discutidos pensando na concretude das condições em que ocorrem. Não podemos seguir ignorando as reinvindicações das putas organizadas, muito menos podemos seguir naturalizando que as tarefas domésticas de cada lar sejam responsabilidade das mulheres e meninas.

Urge que este conjunto de coisas saia das sombras. É essencial estarmos juntes com estes setores em sua organização, como muito se tenta com outros extremamente precarizados do trabalho contemporâneo, tais como trabalhadores de aplicativos, de telemarketing etc. O agravante é que estas parcelas do trabalho, o doméstico e o sexual, existem desde tempos antiquíssimos, sem com isto sequer trazer a mesma atenção devida para a esquerda militante e revolucionária. Pior: sofrem, como já apontamos, com o moralismo que nós todes devemos destruir junto com toda esta própria ordem carcomida na qual estamos imerses, esta ordem burguesa e patriarcal, que se retroalimenta, como uma coisa só. Afinal, é certamente com presença militante, dedicada, organizada que estas formas afeminadas do trabalho podem um dia se emancipar das quatro paredes a que são forçadas existir, de forma análoga à prisão. Pois se nossa luta é pela base, esta certamente é uma base volumosa da pirâmide.

Porém, também entendemos enquanto anarquistas organizades que não será com a simples regulamentação estatal que há de se garantir o fim da hiper-exploração do trabalho no capitalismo, vampiro desta esfera da vida, feito passe de mágica. Contudo, sabemos também que sem melhores condições de trabalho não é possível a própria existência, a própria vida da pessoa trabalhadora aqui-agora. Só é com luta e organização que se torna possível tanto a mudança destas condições, quanto a própria emancipação da vida como um todo. Em suma, é de luta que estamos falando.

Neste 1º de maio, afirmamos: 
Trabalho doméstico é trabalho! Trabalho sexual é trabalho!
Arriba las que cogen! Arriba las que cuidan!
______________________________________________________________________________________
que lutamos e nos organizamos
coletivamente

19 de Junho: Povo forte na rua contra o Estado genocida!

Opinião Anarquista – Junho de 2021

Vamos às ruas de todo o País neste 19 de Junho reforçando a luta pelo Fora Bolsonaro, mas lutamos para além do fim desse governo! As urgências do nosso povo não serão resolvidas com um simples acerto no andar de cima, muito menos nas próximas eleições. Por isso, é necessário cerrar punhos desde baixo, com combatividade e rebeldia, para fazer balançar as estruturas que sustentam os poderosos!

São meio milhão de mortos pela covid-19, vítimas de uma política de morte que não é só do governo Bolsonaro, mas de todo o sistema político e econômico que normalizou essa situação e não conseguiu dar nenhuma resposta para as necessidades da população. Além disso, outros milhares morrem pelas políticas criminosas de ajuste fiscal, de corte de direitos, aumento do desemprego e da fome. O único setor em que o Estado investe é a violência policial racista, que aterroriza as periferias com ameaças, prisão, torturas e matança.

É preciso lutar contra essa situação e reforçar as demandas populares, como auxílio emergencial digno, vacina para todas e todos o mais rápido possível, um basta aos massacres nas comunidades, o fim dos cortes de “gastos” sociais da Saúde e da Educação, o fim das reformas que só prejudicam o povo e das privatizações que enriquecem ainda mais os capitalistas!

O anarquismo organizado sai às ruas com a perspectiva revolucionária de ruptura com esse sistema! Para derrotar as classes dominantes, não há outro caminho a não ser a construção de um Poder Popular de fato, com organização das e dos de baixo em instrumentos como conselhos de bairro e de trabalhadores, por meio da democracia direta, no caminho do Socialismo Libertário!

Desde a base dos movimentos populares, com ação direta combativa, o povo rebelde nas ruas pode reverter essa situação! Só a força popular poderá derrubar Bolsonaro e sua corja, fazer tremer os de cima e construir um mundo novo!

FORA BOLSONARO, MILITARES E PAULO GUEDES!
PELO SOCIALISMO LIBERTÁRIO!
LUTAR, CRIAR, PODER POPULAR!

Coordenação Anarquista Brasileira

 

SOCIALISMO LIBERTÁRIO #4: RESENHA

Chega em nossas mãos, após espera ansiosa da militância especifista, o quarto número da revista SOCIALISMO LIBERTÁRIO, periódico teórico da CAB – Coordenação Anarquista Brasileira. Como de costume, traz artigos que mostram o acúmulo teórico, ideológico e estratégico da organização durante o ultimo período.

O tema desta edição é “Capitalismo, Estado, Luta de classes e Violência” e busca explicar do ponto de vista do Anarquismo estes quatro conceitos, a interrelação entre eles e como se articulam com o colonialismo/imperialismo, o racismo e o patriarcado. A revista traz ainda os artigos “Racismo e dominação colonial” e “Gênero e violência de Estado”, que detalham historicamente o racismo, o patriarcado e consequentemente o machismo, opressões que ocorrem estruturalmente dentro de nossa sociedade e como a questão da classe influencia fortemente essas relações.

Por fim, organizada numa revista ilustrada fartamente e belamente diagramada em 28 páginas, SOCIALISMO LIBERTÁRIO #4 é uma leitura fundamental para que a nossa concepção de Anarquismo se alargue e se fortaleça, incorporando além do ponto de vista classista, as compreensões antirracista e antissexista, para buscarmos combater todas as dominações em todas as suas expressões atuais.

A revista SOCIALISMO LIBERTÁRIO #4 está a venda por 10,00 R$, através de nosso email ou direto em mãos dos compas da Organização Anarquista MARIA IÊDA. Adquira a sua!

CAMPANHA POR VIDA DIGNA: Convocatória Pernambuco!

Convide da Campanha por Vida Digna
Convite da Campanha por Vida Digna

Preocupadas e preocupados com a situação cada vez mais séria pela qual passa o país, nós da Organização Anarquista MARIA IÊDA pretendemos construir localmente a CAMPANHA POR VIDA DIGNA. A ideia é fortalecer caminhos de solidariedade e apoio mútuo entre quem vem sofrendo com o custo e a degradação da vida.

A Campanha por Vida Digna tenta unir os e as de baixo contra os ataques da agenda neoliberal e capitalista: querem privatizar a água, estão acabando com as matas, ameaçando os indígenas e relegando às mulheres negras a tarefa de manter a resistência nas comunidades enquanto promovem o genocídio com a pandemia como desculpa.

Nem aceitamos passivamente a situação, nem deixamos que o medo nos paralise: estamos em todo o país, nos organizando como podemos para fazer ações solidárias, nas vilas e nas favelas. E nos colocando junto a quem precisa, sem nunca parar de dizer que essa crise tem culpados. Sem desistir de lutar por uma vida digna, queremos engrossar ainda mais o caldo da resistência, juntando lutadores e lutadoras populares em ações de propaganda conjunta e mais solidariedade.

Junte-se à Campanha! Divulgaremos aqui no blog imagens, textos e vídeos pra você compartilhar entre os contatos e também um calendário de ações de apoio mútuo <3

Segue abaixo um resumo de alguns dos eixos que, por ora, acreditamos ter relação mais íntima com nossa cidade e estado. Os 13 eixos da Campanha podem ser lidos na íntegra no Repórter Popular. Para outras informações, manda um email para
mariaieda@riseup.net. ^^

É sobre isto: alguns eixos da Campanha

– SAÚDE PÚBLICA E UNIVERSAL: ampliação do SUS, apoio mútuo para conter o contágio pelo COVID-19, distribuição de EPIs para a população e profissionais de saúde.

– CONTRA O DESMONTE DA EDUCAÇÃO PÚBLICA: contra os ataques aos trabalhares e trabalhadoras da educação! Pela suspensão do calendário letivo de escolas, institutos e universidade de acordo com a continuidade do isolamento social. Contra a política neoliberal de implementação do EaD ou de atividades remotas no setor da educação pública.

– DISPENSA REMUNERADA E RENDA SOCIAL PERMANENTE: garantia de dispensa do trabalho nas atividades não essenciais, sem demissões e nem redução salarial. Renda básica permanente de PELO MENOS 1 salário mínimo e meio para todos os trabalhadores e trabalhadoras.

– DIREITO A MORADIA DIGNA: suspensão imediata de despejos ou ordens judiciais de reintegração de posse. Fazer cumprir a função social de edifícios vazios para fim de moradia digna e amparo a todas e todos. Se morar é um direito, ocupar é um dever!

– ABASTECIMENTO POPULAR: disponibilizar mantimentos da merenda escolar para consumo em casa. Possibilidade de uso das cozinhas escolares para a produção de marmitas a serem distribuídas àqueles sem acesso à condições de preparo.

– CONTRA O GENOCÍDIO DO POVO PRETO, POBRE E PERIFÉRICO: contra as ditaduras e o poder de governar pela morte do povo. A crise é permanente contra o povo preto e pobre, atingidos pela ausência de direitos, afetos e oportunidades. Vigiados pela naturalização racista da higienização social.

– PELO FIM DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: o isolamento social traz para perto das mulheres seus agressores e dificilmente elas conseguem expor a situação. Além de conviver com o silêncio da violência são sobrecarregadas com o cuidado da casa e da família, o que afeta ainda mais sua condição psicológica. São as mulheres mais pobres que ocupam a linha de frente do atendimento à saúde e que se expõem como empregadas domésticas.

– DIREITOS DOS LGBTQIA+: pela inclusão de pessoas trans no auxílio emergencial, pela sua ampliação para as que são trabalhadoras informais invisibilizadas pelo Estado, e contra as burocracias do auxílio emergencial que não reconhecem as identidades de gênero e dificultam o acesso de pessoas com nome social. Contra a violência transfóbica e homofóbica que jovens vem sofrendo dentro de casa no isolamento e contra a discriminação do Estado e em atendimentos médicos. Pelo atendimento psicológico gratuito contra a solidão LGBTQIA+ e a favor da saúde mental. Pelo fortalecimento dos grupos de apoio e casas de acolhimento a pessoas LGBTQIA+ em vulnerabilidade durante a pandemia.

Pelo direito de existir sem medo!

Pílulas de História: Maite Amaya e militância LGBTQIA+ na Latinamérica

Junho, além das festas populares, marcou para nós a celebração do orgulho LGBTQIA+. Sabemos que, entre as garrafadas de 28 de junho de 1969 no bar Stonewall e o lamentável fortalecimento da moral fascista nos últimos anos, o movimento se enraizou e manteve a resistência em vários lugares do mundo. No entanto, também se fortaleceu a incorporação da pauta pelo capitalismo, seja através de mais representação em produtos da cultura pop, seja através do estímulo à segregação das identidades que se afunilam em nichos de discurso e consumo. Para uma prática anarquista e, mais amplamente, de esquerda, reconhecer as diferenças e dissidências serve para entendermos, em coletivo, como coexistir sem reproduzir opressão. 

Ou seja, temos de procurar estar juntes, e não em pedacinhos. =)

Na esperança de superar a pandemia e a onda fascista que torna a vida da população LGBTQIA+ ainda mais dramática, resgatamos aqui no blog o vídeo da companheira Maite Amaya. Ela fala da sua luta para existir como mulher trans dentro do movimento feminista e da força que resultou do processo. Maite Amaya faleceu em 2017 e é parte da recente história LGBTQIA+, piqueteira e libertária na Argentina e América Latina. Vamos lembrar de Maite Amaya e dos grupos que, COM MUITO CLOSE, celebram a vida enquanto a defendem todos os dias.

As guei, as bi, as trava e as sapatão, tá tudo organizada pra fazer revolução <3

Links:
Filme Yo, la peor de todas [Youtube] [em espanhol]
Yo, la peor de todas [Wikipedia]
Maite Amaya: el adiós a la guerrera libertaria [Agencia Presentes] [em espanhol]