Quando, na prática, o “melhor” não se diferencia “do menos pior” para a esmagadora maioria dos trabalhadores, é sempre bom lembrar que a mudança verdadeira não virá via voto, mas via organização dos de baixo para lutar por tudo aquilo que lhes diz respeito.
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CAMPANHA POR VIDA DIGNA: Convocatória Pernambuco!

Preocupadas e preocupados com a situação cada vez mais séria pela qual passa o país, nós da Organização Anarquista MARIA IÊDA pretendemos construir localmente a CAMPANHA POR VIDA DIGNA. A ideia é fortalecer caminhos de solidariedade e apoio mútuo entre quem vem sofrendo com o custo e a degradação da vida.
A Campanha por Vida Digna tenta unir os e as de baixo contra os ataques da agenda neoliberal e capitalista: querem privatizar a água, estão acabando com as matas, ameaçando os indígenas e relegando às mulheres negras a tarefa de manter a resistência nas comunidades enquanto promovem o genocídio com a pandemia como desculpa.
Nem aceitamos passivamente a situação, nem deixamos que o medo nos paralise: estamos em todo o país, nos organizando como podemos para fazer ações solidárias, nas vilas e nas favelas. E nos colocando junto a quem precisa, sem nunca parar de dizer que essa crise tem culpados. Sem desistir de lutar por uma vida digna, queremos engrossar ainda mais o caldo da resistência, juntando lutadores e lutadoras populares em ações de propaganda conjunta e mais solidariedade.
Junte-se à Campanha! Divulgaremos aqui no blog imagens, textos e vídeos pra você compartilhar entre os contatos e também um calendário de ações de apoio mútuo <3
Segue abaixo um resumo de alguns dos eixos que, por ora, acreditamos ter relação mais íntima com nossa cidade e estado. Os 13 eixos da Campanha podem ser lidos na íntegra no Repórter Popular. Para outras informações, manda um email para
mariaieda@riseup.net. ^^
É sobre isto: alguns eixos da Campanha
– SAÚDE PÚBLICA E UNIVERSAL: ampliação do SUS, apoio mútuo para conter o contágio pelo COVID-19, distribuição de EPIs para a população e profissionais de saúde.
– CONTRA O DESMONTE DA EDUCAÇÃO PÚBLICA: contra os ataques aos trabalhares e trabalhadoras da educação! Pela suspensão do calendário letivo de escolas, institutos e universidade de acordo com a continuidade do isolamento social. Contra a política neoliberal de implementação do EaD ou de atividades remotas no setor da educação pública.
– DISPENSA REMUNERADA E RENDA SOCIAL PERMANENTE: garantia de dispensa do trabalho nas atividades não essenciais, sem demissões e nem redução salarial. Renda básica permanente de PELO MENOS 1 salário mínimo e meio para todos os trabalhadores e trabalhadoras.
– DIREITO A MORADIA DIGNA: suspensão imediata de despejos ou ordens judiciais de reintegração de posse. Fazer cumprir a função social de edifícios vazios para fim de moradia digna e amparo a todas e todos. Se morar é um direito, ocupar é um dever!
– ABASTECIMENTO POPULAR: disponibilizar mantimentos da merenda escolar para consumo em casa. Possibilidade de uso das cozinhas escolares para a produção de marmitas a serem distribuídas àqueles sem acesso à condições de preparo.
– CONTRA O GENOCÍDIO DO POVO PRETO, POBRE E PERIFÉRICO: contra as ditaduras e o poder de governar pela morte do povo. A crise é permanente contra o povo preto e pobre, atingidos pela ausência de direitos, afetos e oportunidades. Vigiados pela naturalização racista da higienização social.
– PELO FIM DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: o isolamento social traz para perto das mulheres seus agressores e dificilmente elas conseguem expor a situação. Além de conviver com o silêncio da violência são sobrecarregadas com o cuidado da casa e da família, o que afeta ainda mais sua condição psicológica. São as mulheres mais pobres que ocupam a linha de frente do atendimento à saúde e que se expõem como empregadas domésticas.
– DIREITOS DOS LGBTQIA+: pela inclusão de pessoas trans no auxílio emergencial, pela sua ampliação para as que são trabalhadoras informais invisibilizadas pelo Estado, e contra as burocracias do auxílio emergencial que não reconhecem as identidades de gênero e dificultam o acesso de pessoas com nome social. Contra a violência transfóbica e homofóbica que jovens vem sofrendo dentro de casa no isolamento e contra a discriminação do Estado e em atendimentos médicos. Pelo atendimento psicológico gratuito contra a solidão LGBTQIA+ e a favor da saúde mental. Pelo fortalecimento dos grupos de apoio e casas de acolhimento a pessoas LGBTQIA+ em vulnerabilidade durante a pandemia.
Pelo direito de existir sem medo!
Contra ditadores e senhores
O que a onda antifascista e a morte de Miguel têm em comum além do coronavírus
A nova onda de manifestações contra o governo Bolsonaro trouxe o antifascismo de volta ao debate público. Porém, entre Xuxa se declarar antifascista e afirmar que não é de esquerda nem de direita e o presidente associar antifascista a terrorista, tem muita confusão no ar. No compasso da conjuntura, o antirracismo se amplifica: nos Estados Unidos, o assassinato de George Floyd impulsionou o imaginário popular contra o racismo estrutural. Em Pernambuco, a morte do menino Miguel, de 5 anos, atrai gente para as ruas e nos lembra da importância da luta do povo negro contra o racismo que se reproduz desde a colônia. Essas lutas não só acontecem conjuntamente durante a pandemia, como historicamente estão ligadas à luta dos movimentos de esquerda pela emancipação popular.
Todo antifascista tem de ser antirracista. Sempre.

Vamos começar do começo pois História não é bagunça: antifascismo é, na raiz, se opor ao fascismo. E um dos principais troncos do discurso fascista é a SUPREMACIA BRANCA. Por isso, todo fascismo é racista. Todo. Além do caso indiscutível da Alemanha nazista, tanto a Itália de Mussolini, quanto o Integralismo no Brasil eram racistas – mesmo que este último afirmasse que não.
O fascismo italiano concebeu um “racismo místico” e caucasiano com leis que perseguiam politicamente o povo judeu, ou que simplesmente massacravam à época os povos de África com o seu imperialismo, sendo estes perseguidos de forma aberta e brutal, e os primeiros por meio da discriminação pura e simples, sob o lema “discriminar não significa perseguir”. Já o Integralismo defendia que os povos indígenas e afrodescendentes deveriam obrigatoriamente se fundir aos ideiais da “civilização cristã” de origem portuguesa, perdendo assim suas características e particularidades em nome de uma suposta raça mestiça autenticamente brasileira.
Aqui no Brasil, e especialmente em Pernambuco, o racismo é parte de nossa História e de nossas práticas. Resquícios coloniais estão presentes de forma descarada. A casa-grande permanece perseguindo e massacrando o aquilombamento do povo negro e pressionando-o em direção à senzala. Em meio a uma democracia de fachada e burguesa, decretou-se às negras e negros uma liberdade que nunca foi vivida de fato. O povo negro continua com poucos direitos ou com nenhum, em indíces alarmantes de pobreza e precariedade. As mulheres negras são as que mais sofrem com os hábitos coloniais que seguem existindo, sendo empurradas a formar um exército de trabalhadoras domésticas para servir à casa-grande.
O caso do menino Miguel Otávio Santana é retrato disso. Aos 5 anos de idade, Miguel faleceu após despencar dos absurdos 35 metros de altura das Torres Gêmeas enquanto a patroa de sua mãe fazia as unhas. A mãe, trabalhadora doméstica, recebeu a ordem de passear com o cachorro e teve de deixar o filho aos cuidados de Sarí Gaspar Côrte Real, esposa do prefeito de Tamandaré. Patroa e prefeito, aliás, pertencem a oligarquias tanto empresarial quanto política. Assim, compõem uma aristocracia bem típica desta eterna capitania. E é simbólico que esta fatia da elite resida na dupla de prédios de luxo que ameaça o caráter popular do bairro de São José e demarca um projeto de higienização da cidade.
A morte de Miguel é mais um ato de racismo cometido pela elite desta terra de atmosfera colonial. Mesma elite que aposta na fascistização da sociedade e da política quando oportuno. Sem arrodeios, racismo e tirania andam sempre de mãos dadas. E, por isso, se opor ao fascismo é também se opor ao racismo.
Somos antifascistas porque somos de esquerda

Tanto fascismo como racismo são males modernos gerados e reforçados pelo capitalismo e pelo colonialismo. Por isso e não por acaso, foram combatidos pelos movimentos de esquerda, que em substância sempre se demarcaram como anticapitalistas e contra as opressões. E faz sentido. Movimentos de caráter socialista que tinham como pauta a libertação ampla e irrestrita do povo e da classe trabalhadora combateram estes males e foram também protagonistas da luta antifascista .
Na primeira metade do século XX, houve forte presença de amplos setores revolucionários e socialistas que se opunham ao fascismo. Em Roma, a “Arditi del Popolo” (Resistência do Povo) foi pioneira na resistência a Mussolini. A “Schwarze Scharen” (Rebanho Preto, ou Tropas Pretas), na Alemanha foi criada para proteger reuniões do sindicato anarcossindicalista União dos Trabalhadores Livres da Alemanha (FAUD) e da Juventude Anarquista. Na Espanha, o feminismo da Mujeres Libres e o sindicalismo da CNT combateram frontalmente as tropas fascistas do general Franco em 1936. No Brasil, o Comitê Antifascista (composto por anarquistas) e a Frente Única Antifascista (FUA) (trotskista), enfrentaram os integralistas durante a década de 1930, com destaque para a batalha de rua conhecida como “A revoada das galinhas verdes”.
O antifascismo, portanto, se originou e continua no seio das lutas socialistas. Vale lembrar que as cores da bandeira “antifa” são vermelha e preta pois representam o sangue dos que lutaram e o luto pelos que tombaram na busca por uma sociedade igualitária. As figurinhas e memes que vêm circulando com outras cores podem mesmo ser muito bonitas e engraçadas, mas também podem servir para transformar uma ideia tão necessária e urgente em mais uma piadinha de internet.
Da história às cores, o antifascismo é de esquerda.
Fascismo e racismo têm de ser destruídos

Declaramos isto porque a direita, além de nos roubar todos os dias via políticas de Estado, agora quer apagar o que o sangue de milhões gravou nas páginas da História. Fascismo é, em último caso, o nome que devemos dar para as atrocidades que eles defendem. E terrorismo é o que faz o governo Bolsonaro: jogar o povo à miséria no meio de uma crise sanitária mundial. Enquanto nós, antifascistas e de esquerda, integramos movimentos que distribuem mantimentos e kits de limpeza e tentamos, com muito suor e sacrifício, assegurar a resistência da população negra e pobre neste momento tão dramático.
A família de Miguel não deveria estar trabalhando. Ele não deveria estar perdido naquelas torres enquanto patrões com ares de sinhô e sinhá continuam apreciando a vista que privatizaram, como uma afronta. Miguel tombou por racismo. Sua família e milhões de outras estão sofrendo as consequências de ideias e práticas que, estas sim, deveriam ser jogadas no fosso de uma História que não queremos que exista mais.
Antifascismo é romper com tiranos. Antirracismo é romper com os senhores. Nada mais antifascista que apoiar a luta do povo preto.
A resistência é vermelha. A resistência é negra.
Arriba las que luchan! Arriba los que luchan!
Miguel, presente.